quarta-feira, novembro 22, 2006

"Memórias de um Branco Excluído"
Nunca pensei que pudesse existir isto em um país basicamente leucodérmico.

Mas existe.

Hoje percebo que deveria ter escutado minha mãe antes de emigrar para esta ilha tão solitária e preconceituosa. Ainda escuto suas vãs recomendações:

"-Gu, não pense que lá será muito diferente do que aqui"

ou

"-Gu, você fez sua carreira por aqui...recomeçar de novo pra quê? Pode ser tão desanimador..."

E foi.

Desde que cheguei por aqui tem sido uma enorme dificuldade usufruir das minhas inerentes qualidades de arquiteto.

Primeiro, porque não consegui me adaptar novamente às medievais réguas paralelas e 'T's, e muito menos ao abominável normógrafo. Ainda mais os daqui. Sim, a tecnologia ainda não chegou por aqui. Como pude ser tão mal-informado?

Segundo, porque talvez eu já estivesse procurando mesmo outra atividade. Senão por que emigraria, né?

Com muita dificuldade tive que procurar até achar uma nova profissão, e não com menos dureza e muita, mas muita determinação mesmo, consegui me destacar nesta nova atividade: A Carpintaria.

Com novos instrumentos à tira-colo, feitos por mim mesmo, e adaptando-os à nova realidade, cresci como profissinal e acabei sendo até reconhecido por artesões desta pequena e fechada comunidade do Pacífico.

E graças à esta persistência tenho conseguido sobreviver (por enquanto...)

O grande problema continua sendo esse preconceito que me persegue e que cada vez mais me exclui de qualquer tipo de contato social.

Já até me acostumei com as caras de horror dos vizinhos de mictórios nos banheiros públicos mesmo quando não erro o alvo(mas que dificuldade esses mictórios estrangeiros!); com a falta de amigos, tanto no trabalho como na própria comunidade; e em nunca ser convidado para os famosos jogos de cartas e snooker por medo que eu estrague suas únicas diversões.

Mas tudo isso não é nada. O quê realmente me deixa arrasado é como sou evitado, principalmente pelas mulheres de quem me aproximo. Feias ou bonitas; gordas ou magras. É constrangedor.

Por que este medo de um pobre imigrante?

Namorar, casar? Nem pensar. Nunca nem toquei no assunto, até porque nunca tive um diálogo que fosse além de um 'bom dia-boa noite' com as moçoilas daqui. Que, diga-se de passagem, são verdadeiros pitéus de tão frágeis e delicadas.

Mesmo dos mais reles lupanares sou incansavelmente expulso com olhares de nojo e indignação. Dizem que espanto os clientes mais inseguros, por que seria?

A esta altura da vida, se assim posso chamá-la, só me resta oferecer um conselho: "Se pensas em mudar para estas plagas, traga uma mulher à sua altura, ou pelo menos com a sua altura."

Gulliver.

Lilliputh, novembro de 2006

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